Artigo

Por 
Sidval Oliveira

Última Atualização
25/05/23

Tempo de Leitura
5 minutos

Superendividamento do Consumidor: A Teoria da Imprevisão não se aplica (por completo)

As Limitações da Teoria da Imprevisão no Contexto do Superendividamento.

No Brasil atual, onde os consumidores enfrentam desafios financeiros cada vez mais complexos, o superendividamento se tornou uma realidade preocupante.

Muitos consumidores se encontram em situações de dificuldades extremas devido a encargos financeiros insustentáveis, como juros estratosféricos.

Em busca de soluções, alguns consumidores podem considerar a aplicação da lei do superendividamento. No entanto, há crescente distorção do judiciário ao aplicar a teoria da imprevisão dos contratos para consumidores superendividados.

Neste artigo, vamos explorar as razões pelas quais a teoria da imprevisão não se aplica a essa situação desafiadora.

  • O que é teoria imprevisão?
  • Norma de caráter especial
  • Inversão do ônus da prova

 

O que é teoria imprevisão?

A teoria da imprevisão prevista no Código Civil brasileiro, nos artigos 478 a 480, trata da possibilidade de revisão de contratos em casos excepcionais nos quais ocorrem eventos imprevisíveis que afetam significativamente o equilíbrio contratual.

Permite que as partes revisem ou até mesmo rescindam o contrato quando as circunstâncias imprevisíveis tornam a execução excessivamente onerosa para uma das partes.

Portanto, norma de caráter geral contratual.

O problema é que o judiciário vem negando o processo repactuação de dívidas por mero descontrole financeiro do consumidor exigindo o que a lei não exige, distorcendo o recente instituto de inclusão social em favor do spread bancário.

De duas ou uma, ou há um evidente descompromisso judicial com o povo brasileiro ou na pior das hipóteses é um compromisso tácito entre o judiciário e os bancos com relação aos juros remuneratórios.

Na primeira, não há muito que falar diante da pobreza no país que salta aos olhos, os lucros bancários e maior juros real do mundo.

Na segunda, a jurisprudência defensiva em torno de revisões de juros bancários por si só já confirma aquele compromisso, sobretudo porque a tese da média da taxa dos juros, usada  para declarar à abusividade, é composta e feita pelas próprias instituições financeiras , já que o Banco Central apenas coleta os dados fornecidos pelas instituições financeiras.

Não há sobre aqueles dados (média da taxa de juros) qualquer participação da sociedade brasileira.

Norma de caráter especial

A Lei do Superendividamento (Lei n. 14.181/2021) é norma de caráter especial e de inclusão social.

Isso implica em reconhecer sua aplicação, a despeito de ter entrado em vigor posteriormente, ela afasta a aplicação da teoria da prevista no Código Civil brasileiro, nos artigos 478 a 480, na medida em que constitui norma de caráter especial, voltada exclusivamente para a repactuação das dívidas do consumidor superendividado, ao passo que aquela é norma de caráter geral.

Deve prevalecer, no caso, a regra de hermenêutica segundo a qual lei especial derroga lei geral (lex specialis derogat legi generali) em detrimento daquela segundo a qual lei posterior derroga lei anterior naquilo em que com ela for conflitante (lex posterior derogat legi priori).

Afinal, “A alteração promovida no Código de Defesa do Consumidor, por meio do normativo legal n.º 14.181/2021, de 1º de julho de 2021, supriu lacuna legislativa a fim de oferecer à pessoa física, em situação de vulnerabilidade (superendividamento), a possibilidade de, perante seus credores, rediscutir, repactuar e, finalmente, cumprir suas obrigações contratuais/financeiras.” (STJ, CC 193066 – 2022/0362595-2 , data do julgamento: 22/03/2023)

Segundo o Min. Relator MARCO BUZZI:

Nesse contexto, além de incluir os arts. 54-A a 54-G ao Código de Defesa do Consumidor – CDC para abordar especificamente da prevenção e tratamento ao superendividamento, a norma prevê forma específica de tratamento judicial do fenômeno, a saber: o juiz, a requerimento do devedor, poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, tutelado pelo art. 104-A e seguintes da legislação consumerista, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado, com a presença de todos os credores de dívidas, oportunidade em que o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.

Inversão do ônus da prova

Como se isso não bastasse, o judiciário ao aplicar a imprevisão como requisito para o processo judicial de repactuação de dívidas do consumidor superendividado impõe a ele (consumidor) provar sua boa-fé e o evento imprevisível de vida (desemprego, doença etc.).

Isso porque, cabe apenas aos credores comprovarem a prática atos contrários à boa-fé objetiva do consumidor superendividado ao buscar repactuação de dívidas (art. 104-A, §1º), porque ele (consumidor superendividado) deve apenas comprovar inicialmente o superendividamento a exigir a pronta intervenção do judiciário com objetivo de garantir o mínimo existencial para ele e sua família, além de evitar a sua ruína financeira.

No contexto do superendividamento, em que um consumidor está enfrentando dificuldades financeiras extremas devido a encargos excessivos, como juros elevadíssimos, é possível que o processo de repactuação de dívidas seja invocado para impedir sua ruína financeira.

Por final, há evidente alargamento dos requisitos da Lei n. 14.181/2021 por parte do judiciário, especialmente para o deferimento do processo de repactuação de dívidas, ao considerar como requisito a ocorrência de algum fato extraordinário da vida.

Assim, merece destaque o julgamento no Conflito de Competência 193066 do Superior Tribunal de Justiça que deve servir como fundamento jurídico para os processos de repactuação de dívidas, porque delineou os princípios, requisitos e objetivos da lei.   

Advogado devidamente inscrito na OAB/SP 168.872. Especialista em Direito Imobiliário.
Foi vice-presidente da Comissão de Direito de Família e membro da Comissão do Consumidor da OAB/Campinas e membro da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CONTRIBUINTES – ABCONT.
Advogado expert em processos contra grandes empresas.

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