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Pensão alimentícia incide sobre rendimentos por fora

Comprovação pela confissão de verbas salariais mascaradas em reclamação trabalhista

A 3ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP manteve a decisão da 3ª Vara da Família de Campinas que afastou a impugnação ao cumprimento de sentença de pensão alimentícia sobre rendimentos pagos “por fora” do devedor confessados em outro processo (reclamação trabalhista), em causa defendida pelo advogado Sidval Oliveira.

A Autora, credora da pensão alimentícia, após conhecimento das verbas pagos fora do holerite em reclamação trabalhista do devedor, entrou com o cumprimento de sentença (execução de alimentos) sobre aquelas verbas salariais recebidas e não pagas.

Além de não ter ocorrido a prescrição inocorrente, porquanto o prazo previsto no art. 206, §2º, do CC, somente tem início da data da ciência da alimentante, na medida em que se tratava de verbas salarias mascaradas.

O devedor impugnou alegando que as verbas recebidas da ex-empregadora são resultados de acordo e não tinha havido decisão judicial reconhecendo tratar-se de salário dissimulado de PLR.

Segundo o Des. Relator decidiu sobre a prescrição:

“Em segundo lugar, não obstante a previsão do art. 206, §2º do Código Civil, no sentido de que a pretensão de receber alimentos prescreve em 2 anos, é certo que, no caso, tal prazo só tem início da data do conhecimento da confissão do alimentante acerca do recebimento de salário dissimulado.

Ou seja, uma vez que se tratava de recebimento de salário disfarçado por acordo entre empregado e empregadora e que a reclamação trabalhista tramitou em segredo de justiça, tal informação somente foi conhecida pela alimentante quando da juntada das peças daquele processo nos autos da ação de alimentos por ordem do MM. Julgador a quo, em 16/01/2018. Inocorrente, portanto, a prescrição.”

 

E ainda, sobre o mérito:

 

“Como bem asseverado pelo douto julgador de origem, o devedor reconhece, por intermédio de seu procurador em reclamação trabalhista, que os valores recebidos, entre 2011 e 2013, tinham natureza salarial, mas eram pagos pelo banco, como luvas ou PLR para fins de sonegação de impostos trabalhistas.

Veja-se:

“Tratava-se de prática habitual do banco a concessão a seus empregador de “bônus de retenção”, internamente chamada por todos de “luvas”. Para a concessão de tal bônus de retenção, a reclamada mascarava a referida concessão através de contratos bancários de empréstimo/mútuo, embutido na referida transação a cláusula de permanência (…) Se o empregado permanecesse no banco reclamado pelo prazo estipulado, recebia o valor das luvas sem pagar nenhum centavo pelo contrato de empréstimo/mútuo que se autoliquidava automaticamente (…)”.

O fato de inexistir decisão de mérito, naquele Juízo especializado, é irrelevante porquanto o acordo entabulado entre as partes diz respeito às estratégias das partes, mas não macula a confissão expressa do devedor acerca do recebimento de salário.

Anota-se, inclusive, que a ex-empregadora, ao concordar com o pagamento de valor significativo no acordo trabalhista, demonstra que, em alguma medida, as alegações do funcionário são verdadeiras.

No mais, tem-se que não houve impugnação dos cálculos apresentados pela agravada em primeira instância (ps. 96/105), sendo incabível a inovação em sede recursal (ps. 16/18).

Por isso, por este voto, nega-se provimento ao agravo de instrumento.”

Leia o acórdão.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2020.0000130851
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2276820-81.2019.8.26.0000, da Comarca de Campinas, em que é agravante M. P., é agravada C. A. P.. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOÃO PAZINE NETO (Presidente) e ALEXANDRE MARCONDES.
São Paulo, 24 de fevereiro de 2020.
CARLOS ALBERTO DE SALLES
Relator
Voto nº: 20878
EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. IMPUGNAÇÃO. Insurgência contra rejeição. Manutenção. Preliminares. Inépcia inexistente.
Narrativa da exequente que permite identificar o pedido e a causa de pedir. Prescrição inocorrente porquanto o prazo previsto no art. 206, §2º, do CC, somente tem início da data da ciência da alimentante, na medida em que se tratava de verbas salarias mascaradas. Gratuidade processual que não pode ser deferida, porque os elementos dos autos dão conta de que o executado possui condições de arcar com as custas do processo.
Preliminares não acolhidas. Mérito. Confissão do devedor, em reclamação trabalhista, acerca do recebimento de bônus de salário disfarçados. Desnecessidade da existência de tutela de mérito nos autos da reclamação trabalhista, sendo certo que houve acordo em valor considerável. Demais impugnações que não foram tratadas em primeira instância. Rejeição da impugnação mantida. Recurso não provido.
Trata-se de agravo de instrumento tirado contra decisão de ps. 172/174 e 217 que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença, para determinar o prosseguimento da execução, pelo valor inicialmente pleiteado (R$ 290.557,98), acrescido de multa e honorários advocatícios, ambos no percentual de 10% do valor da dívida, autorizado, desde já, o bloqueio dos ativos financeiros, via Bacenjud, além de indeferir a gratuidade processual e determinar a juntada de documentos, comprovando a data da citação da credora na ação revisional e a cópia da sentença/acórdão e trânsito em julgado respectivas.
Pleiteia o agravante a reforma do decisum, alegando, em síntese, que pagou alimentos para a filha por 26 anos; que a presente execução visa ao recebimento de percentual de verbas trabalhistas recebidas como reflexos de horas extras e, portanto, que não são parte da base de cálculo. Sustenta, ainda, que os benefícios da gratuidade devem ser concedidos porque a declaração de pobreza goza de presunção juris tantum de veracidade; porque trouxe declaração de imposto de renda de 2018/2019 demonstrando a hipossuficiência financeira, assim como prova de que está fora do mercado financeiro; porque seu nome, ademais, está inscrito no cadastro de inadimplentes; porque não tem relação com a vida econômica de sua cônjuge com quem, ademais, é casado com separação total de bens e porque o último registro na CTPS é de 2016, assim como o acordo trabalhista.
Reitera, ademais, os argumentos trazidos na impugnação ao cumprimento de sentença: inépcia da inicial, prescrição (art. 206, §2º CC), que, à época do recebimento da verba trabalhista (2011 a 2013), os alimentos eram de 10% sobre os rendimentos líquidos, excluídos PLR; que há decisão judicial já afastando a incidência sobre esse montante; que as verbas recebidas da ex-empregadora são resultados de acordo e não houve decisão judicial reconhecendo tratar-se de
salário dissimulado de PLR, como aduz a exequente; que, se mantida essa incidência, o valor líquido recebido pelo agravante seria de R$ 395.456,06 e, portanto, os alimentos (10%) seriam de R$ 39.545,60 e não quase 300 mil reais; que os valores mencionados pela agravada como “luvas” são, na realidade, empréstimos bancários e renegociação, cuja quitação deu-se exatamente pelo recebimento de PLR; e, finalmente, que, em ação revisional, os alimentos foram alterados para 2,5 salários mínimos.
Foi indeferido o pedido de efeito suspensivo.
Apresentada contraminuta (ps. 232/249), encontram-se os autos em termos de julgamento.
É o relatório.
Cuida-se de cumprimento de sentença visando ao pagamento de R$ 277.860,36, atualizado até fevereiro de 2018 (ps. 88/94) referente à pensão alimentícia no percentual de 10% dos valores salariais recebidos de forma dissimulada de “luvas” e “PLR”, entre 2011 e 2013, que à época, totalizaram R$ 1.276,792,26. Intimado para pagamento em março de 2018 (p. 94), o executado apresentou impugnação.
Contra a rejeição da impugnação, insurge-se o devedor nesta oportunidade.
De início, rejeitam-se as preliminares de inépcia da inicial e prescrição.
Primeiro, porque da leitura dos autos e possível depreender-se o pedido e as razões da agravada, não havendo prejuízo à compreensão da pretensão deduzida em juízo ou ao exercício do contraditório e ampla defesa por parte da agravante.
Nessas circunstâncias, inviável o reconhecimento da inépcia, como se extrai de precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE OFENSA AO ARTIGO 535 DO CPC. INÉPCIA. INICIAL. DESCRIÇÃO SUFICIENTE DOS FATOS. LEGITIMIDADE. SÚMULA 7. SEGURO-SAÚDE. DOENÇA PREEXISTENTE. RECUSA DE COBERTURA. EXAME PRÉVIO OU MÁ-FÉ DO SEGURADO.
– Não há ofensa ao Art. 535 do CPC se, embora rejeitando os embargos de declaração, o acórdão recorrido examinou todas as questões pertinentes.
– Não é inepta a petição inicial que descreve os fatos e os fundamentos do pedido, ensejando ao réu exercício de sua defesa. Precedentes.
– “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.
– É ilícita a recusa da cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente à contratação do seguro, se a Seguradora não submeteu o segurado a prévio exame de saúde e não comprovou má-fé. (AgRg no Ag 777.211/MG, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/09/2006, DJ 16/10/2006, p. 369 sem destaque no original.)
Em segundo lugar, não obstante a previsão do art. 206, §2º do Código Civil, no sentido de que a pretensão de receber alimentos prescreve em 2 anos, é certo que, no caso, tal prazo só tem início da data do conhecimento da confissão do alimentante acerca do recebimento de salário dissimulado.
Ou seja, uma vez que se tratava de recebimento de salário disfarçado por acordo entre empregado e empregadora e que a reclamação trabalhista tramitou em segredo de justiça, tal informação somente foi conhecida pela alimentante quando da juntada das peças daquele processo nos autos da ação de alimentos por ordem do MM. Julgador a quo, em 16/01/2018. Inocorrente, portanto, a prescrição.
Também deve ser mantido o indeferimento da gratuidade processual.
Não obstante para o artigo 99, §3º, do Código de Processo Civil e para o artigo 3º da Constituição do Estado de São Paulo bastem a afirmação de insuficiência de recursos para fazer jus aos benefícios da assistência judiciária, a Constituição Federal, no inciso LXXIV, do artigo 5º prevê expressamente a assistência jurídica “aos que comprovarem insuficiência de recursos”.
No caso em exame, a alimentante não se desincumbiu do ônus de demonstrar a hipossuficiência financeira. Trata-se, na realidade, de profissional de elevada qualificação que possui imóveis de
alto padrão com a atual esposa e que recebeu, há poucos anos, valor considerável em acordo trabalhista.
Superadas as preliminares, no mérito, melhor sorte não lhe assiste.
Como bem asseverado pelo douto julgador de origem, o devedor reconhece, por intermédio de seu procurador em reclamação trabalhista, que os valores recebidos, entre 2011 e 2013, tinham
natureza salarial, mas eram pagos pelo banco, como luvas ou PLR para fins de sonegação de impostos trabalhistas.
Veja-se:
“Tratava-se de prática habitual do banco a concessão a seus empregador de “bônus de retenção”, internamente chamada por todos de “luvas”. Para a concessão de tal bônus de retenção, a reclamada mascarava a referida concessão através de contratos bancários de empréstimo/mútuo, embutido na referida transação a cláusula de permanência (…) Se o empregado permanecesse no banco reclamado pelo prazo estipulado, recebia o valor das luvas sem pagar nenhum centavo pelo contrato de empréstimo/mútuo que se autoliquidava automaticamente (…)”.
O fato de inexistir decisão de mérito, naquele Juízo especializado, é irrelevante porquanto o acordo entabulado entre as partes diz respeito às estratégias das partes, mas não macula a confissão expressa do devedor acerca do recebimento de salário.
Anota-se, inclusive, que a ex-empregadora, ao concordar com o pagamento de valor significativo no acordo trabalhista, demonstra que, em alguma medida, as alegações do funcionário são verdadeiras.
No mais, tem-se que não houve impugnação dos cálculos apresentados pela agravada em primeira instância (ps. 96/105), sendo incabível a inovação em sede recursal (ps. 16/18).
Por isso, por este voto, nega-se provimento ao agravo de instrumento.
CARLOS ALBERTO DE SALLES
Relator

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Advogado – OAB/SP 168.872. Especialista em Direito Imobiliário. Foi vice-presidente da Comissão de Direito de Família da OAB/Campinas e membro da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CONTRIBUINTES – ABCONT.

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